A crise provocada pela pandemia do novo coronavírus promoveu mudanças estruturais no mercado de trabalho que tendem a intensificar ainda mais o desemprego entre pretos e pardos em 2021. É o que aponta o economista da FGV (Fundação Getúlio Vargas), Marcelo Neri.
Segundo o pesquisador, que é diretor da FGV Social, pretos e pardos foram os mais beneficiados pelo Programa de Preservação de Emprego e Renda instituído pelo governo federal diante da pandemia, que permitiu a suspensão de contratos e redução das jornadas de trabalho.
Por meio do programa, os trabalhadores que tiveram o contrato suspenso ou a jornada reduzida passaram a receber o Bem (Benefício Emergencial), pago pelo governo. As empresas, em contrapartida, ficaram obrigadas a garantir a estabilidade dos trabalhadores por um período igual ao da suspensão dos contratos ou redução da carga horária.
Neri aponta que o desemprego – que avançou muito mais entre pretos e pardos que entre os brancos – foi atenuado pelo programa do governo. Mas ele prevê que haverá um “efeito rebote” tendo em vista a lenta recuperação da economia diante da crise provocada pela pandemia.
“Gradativamente, é de se esperar que as firmas aumentem as demissões. Então, a gente acha que o desemprego tende a aumentar mais depois de 31 de dezembro, quando termina a validade desse programa que pode ter sido até mais importante para pretos e pardos, porque ele tende a beneficiar mais a base do mercado de trabalho”, destacou o pesquisador.
Ao processar os microdados da Pnad-Covid, versão da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua criada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) para avaliar os efeitos da pandemia sobre o mercado de trabalho, a FGV Social constatou que os pretos e pardos tiveram queda superior do número de horas trabalhadas na comparação com os brancos.
“A nossa hipótese é que essa redução do número de horas trabalhadas foi efeito do programa temporário de suspensão de contratos e redução da jornada de trabalho”, disse Neri.
Piora nos indicadores do mercado de trabalho e educação
Os dados oficiais do mercado de trabalho divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e pelo Ministério da Economia apontaram que pretos e pardos foram os mais afetados pela crise provocada pela pandemia.
O desemprego aumentou entre todos os grupos raciais, mas com mais intensidade entre os pretos. A ocupação no mercado de trabalho foi reduzida de modo geral no país, mas também foi mais expressiva entre os pretos. Para o economista Marcelo Neri, da FGV, esses efeitos tendem a ser de médio a longo prazo.
“A pandemia trouxe piores efeitos trabalhistas, e esses efeitos são importantes porque vão persistir após a pandemia, porque são estruturais”, enfatizou o pesquisador. Outro efeito estrutural provocado pela pandemia, segundo Neri, ocorreu no campo educacional brasileiro, que trará efeitos também sobre o mercado de trabalho.
“A pandemia representou uma quebra de uma série de 40 anos da educação. A escolaridade vinha crescendo mais entre pretos e pardos, mas caiu com a pandemia. Os dados do IBGE mostraram que o tempo de estudo em casa caiu mais para os mais pobres, e eu diria que isso é uma tendência e que efeito tende a ser de longo prazo”, enfatizou o pesquisador da FGV.
Fonte: O Sul